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18 novembro 2011

Halasana

Postura do Arado
halasana  [halAsana] - postura do arado
hala [hala] - arado
de Flavia Venturoli de Miranda
2011
O arado é um instrumento agrícola que serve para revolver e sulcar a terra, que fica fofa, arejada e ensolarada. O solo, assim rasgado pelo arado, facilita o enraizamento da semente e a irrigação.
Sua invenção tem a data estimada em 6.000 aC e talvez tenha se dado na civilização do Vale do Indus.
Arado manual
O arado é uma das ferramentas mais marcantes da humanidade, pois graça a sua invenção começou haver excedente de alimentos e a população humana disparou em crescimento, formando cidades e iniciando o comércio. É um símbolo da mudança do homem nômade, caçador-coletor, para o sedentário, agricultor e pecuarista. A domesticação de animal da pecuária trouxe o incremento da aração por tração animal.

Arado de tração com bufalos
A relevância do arado na mitologia da Índia podem ser podem ser vista nas lendas da Sita [sItA], esposa do deus Rama [rAma] e de Balarama [balarAma], irmão do deus Krishna [kRRiSNa].
Os irmãos Krishna e Balarama
 Sita brota da terra sulcada pelo arado do rei Janaka [ ] quando fazia um ritual para ter um filho. Ela foi adotada por ele e por sua esposa  Sunayana [ ]. Por este motivo, Sita está associada a Bhumi Devi [bhUmI devI], a deusa da terra e é a protetora da agricultura. Sita é uma avatara de Lakshmi [lakSmI avatAra], a deusa da prosperidade, é esposa do deus Rama, que é o 7º avatar de Vishnu [viSNu]. Ela é o símbolo da feminilidade e da esposa fiel. Sua história é contada no épico Ramayana [rAmAyaNa].
Janaka encontra Sita ao sulcar a terra com o arado
Balarama é o irmão mais velho do deus Krishna (8º avatar de Vishnu). Outro nome para ele é Halayudha [halAyudha], aquele que porta o arado como arma. Conta a lenda que a deusa rio Yamuna [yamunA] desacatou um comando de Balarama, que furioso usou sua arma arado, hala, e abriu vários braços afluentes para o rio, dragando e desviando o curso da água, irrigando uma grande área do norte da Índia.
Balarama draga o rio Yamnuna criando afluentes
Yamuna percebendo sua negligência perante a esse deus tão poderoso, pediu desculpas e o referenciou. A partir de então, Balarama é reverenciado nos vários tributários do rio Yamuna. 

Yamuna pede desculpa a Balarama
Essa região altamente irrigada, parte da planície gangética é tão próspera que foi berço que grandes dinastias e impérios da Índia.
tributários do rio Yamuna
 Assim, podemos associar o arado ferramenta e arma de prosperidade com a postura do arado, halasana, como uma maneira de tornarmos prósperos. O arado é uma arma porque sua lança fende, fere a terra e de forma lancinante prepara, revolve, irriga e lavra o cultivo. De tal modo ao cultivamos nossa prosperidade com a prática da postura do arado.

O halasana é um viparita [viparIta], uma postura invertida, como tal, não desperdiçar o amrita [amRRita], a imortalidade. Fisiologicamente, nessa postura trabalha-se fortemente com o alongamento das colunas cervical e torácica. Facilita a circulação venosa das pernas e aumenta a irrigação cerebral. Por isso mesmo deve ser alcançada paulatinamente e com cautela. É contra-indicada para pessoas com glaucoma ou que estão passando por cefaléia ou aumento da pressão sanguínea.

Variações:
Halasana na parede, quando se inicia a postura em viparita, ou no final para apoiar os pés na parede.

Há muitas variações com os braços:
com as mãos apoiadas nas costelas posteriores;
com os braços pelas costas apoiados no chão com os dedos entrelaçados;
os braços esticados acima da cabeça, segurando os dedos dos pés – urdhva pashchimottanasana [Urdhva pashcimottanAsana]
abraçando as coxas.

halasana variações com uma perna no chão e outra apontado para o alto, ekapada sarvangasana [ekapAda sarvA~ngAsana]

com torção como parshva halasana [pArshva halAsana], quando as duas pernas viram para um dos lados.
com as pernas afastadas em urdhva kona halasana [UrdhvakoNahalAsana]
 

Fonte:
halasana [halAsana] - Light on Yoga – B.K.S. Iyengar
parshva halasana [pArshva halAsana] -
Light on Yoga – B.K.S. Iyengar
urdhva pashchimottanasana [Urdhva pashcimottanAsana] - Light on Yoga – B.K.S. Iyengar

akunchanasana [Aku~ncanAsana] - Light on Yoga – B.K.S. Iyengar

karnapidasana [karNapIdAsana] - Light on Yoga – B.K.S. Iyengar

Fontes históricas:
Segundo Encyclopaedia of Traditional Asanas – Dr. Gharote – Lonavla

02 novembro 2010

Céu e Terra

por Flávia Venturoli de Miranda

Dyaus 

 

Dyaus - Céu
               Dyaus [ ] é o céu, em todas as suas 3 facetas, o céu cósmico, que é o próprio cosmos, o céu paradisiaco, morada dos deuses e o céu atmosférico. Significa brilhante, dia, diário, é o deus do céu brilhante. 

Dyaus - Deus Céu
               Nos Vedas é o céu pai, chamado de Dyaus Pita ou Pitr [pitA ou pitRRi]. Casa-se com a terra, Prithivi, com tem as filhas auroras, Ushas [uSas], também, o fogo Agni [ ] (RV 3.25.1), e, o clima da atmosfera, Indra [ ] (RV 4.14.4).

Ushas - Aurora filha do Céu

Agni - Fogo filho do Céu

Indra - Senhor do Clima filho do Céu
               No Purusha Sukta diz que Dyaus nasceu da cabeça do próprio Homém Cósmico, Purusha [puruSa]. As vezes dizem que Dyaus e Prithivi foram criados por Indra, assim ele é suplantado por um deus mais novo, e cai no esquecimento, tornando-se um deus otiosus, como dira Mircea Eliade. Indra assumi então seus atributos.

Prithivi


Prithivi - Terra

               Prithivi [pRRithivI] tem uma vida simbólica longa. Prithivi, que significa amplidão, é a deusa Terra, casada com o Dyaus. Ela é a mãe Terra Prithivi Mata ou Matr [mAtA ou mAtRRi]. Nos Vedas aparece sempre em companhia do marido, Dyavaprithivi [dyAvApRRithivI], o Céu fertiliza a Terra através da chuva que frutifica. Segundo Kinsley, nos Vedas, eles eram apenas um, que foram separados por Varuna, mas que voltaram a se unir pela chuva. Como seu marido, a Terra tem 3 níveis, a terra onde pisamos, a Terra planeta, e o interior da terra. No Purusha Sukta, bhumi [bhUmi], um outro nome para o chão terra (ou prithivi bhumi), surgiu dos pés do Homém Cósmico. 


Prithivi - Deusa Terra
 
               Nos Vedas, Prithivi é a mãe de Ushas, Agni e Indra.

Ushas - Aurora filha de Prithivi
Agni - Fogo filho de Prithivi
Indra - Atmosfera filho de Prithivi
               Posteriormente, no Visnhu Purana [viSNu puraNa], dizem que Prithivi recebeu seu nome de seu pai Prithu [pRRithu], que ao ver a fome no mundo, criou uma vaca chamada Prithivi que proveria a todos com frutos constantemente, até mesmo aos deuses.

               A Terra, como deusa, é fértil e benigna, é a mãe que cuida e nutri suas crias com grão, leite e vida. Protege e é firme, traz prosperidade, consolida e sustenta a todos. 

Prithivi Tattva - Muladhara Chakra
                Prithivi posteriormente será associada ao elemento terra, prithivi tattva da filosofia Samkhya [sAMkhya], com toda a conotacação de firmeza, solidez, prosperidade e fecundidade. Interiormente, esse tattva se assenta em nosso assento, no muladhara chakra [mUlAdhAra cakra] dando a estabilidade e prosperidade de uma barra de ouro interior. Seu yantra [ ] é justamente um cubo dourado como ouro.

Prithivi Tattva Yantra
 
Bibliografia
CAMPBELL, Joseph, As Mascaras de Deus – Mitologia Primitiva. 8º ed, São Paulo: Palas Athena, 2010.
ELIADE, Mircea. O Sagrado e o Profano: a Essência das Religiões. 2ª ed, São Paulo: Martins Fontes, 2008.
KINSLEY, David R. Hindu Goddesses – Visions of the Divine Femine in the Hindu Religious Tradition. Berkley: University of California Press, 1998
BULLEN, Matthew, e et. National Geographic: Guia Visual da Mitologia no Mundo. São Paulo, Ed. Abril, 2010
WILKINS W.J, Hindu Mythology, Vedic and Puranic, 1900, at sacred-texts.com, in 05/10/2010
WILLIAMS Monier, Sankrit-English Dictionary, digital V1.5 beta

22 outubro 2010

Noite e Dia


por Flávia Venturoli de Miranda

Varuna

10.000 galáxias nessa pequena porção da escuridão cósmica

                  Varuna [varuNa] significa o encobridor do céu. É um dos deuses mais antigos da Índia, é o deus noite, escuridão, é o caos primordial, que antecede a tudo. Por isso é o rei dos deuses, dos mundos e dos homens, é o sustentáculo do céu da terra. Pertence a classe dos seres escuros, asuras. O Rta Sukta [RRita sUkta] conta que a ordem cósmica e a verdade se originaram da noite através do tapas e dali surgiram os oceanos e os anos etc. Assim podemos inferir que Varuna, como o regente da noite primordial, é a raiz da ordem cósmica, rta.

 

                Curiosamente é também cultuado no zoroastrismo como Ahura Mazda.
                      Ahura Mazda

               Varuna une-se com Mitra, a deusa dia, também responsável pela ordem cósmica.

Varuna montado em Makara.
               Indra toma seu trono de rei dos deuses. Varuna passa a reinar sobre os oceanos celestiais, as águas insondáveis e profundas das origens, e o classificam como um dos aditya-s [Aditya]. As vezes também é citado como um daitya [ ], quando reina sobre os gandharva-s [ ]. Nessa fase como governante do oceano cósmico, em algumas iconografias, tem como montaria Makara [mAkara], um monstro marinho, traduzido normalmente como um crocodilo. Também como deus do oceano é pai de lótus, Pushkara [puSkara].

Pushkara - lótus azul filha de Varuna
 

Mitra

 



                Mitra [mitrA] significa companhia, amigo, amizade. É a deusa dia, que traz ordem, rta, ao caos primordial. Mitra chama os homens para a atividade e deixa os olhos vigilantes. Forma um casal com Varuna, a escuridão e juntos governam rta.

Por ordenar os mundos também sustenta o céu e a terra como seu marido. É uma apsara [Apsara] é chamada de Chitra [citrA], que significa brilhante, distinta, multicolor.

               Como deus, Mitra [ ], é um dos adityas, é o deus dia protetor da ordem, parceiro de Varuna. Curiosamente, esse deus é visto em várias religiões, no zoroastrismo, Mithra. Depois durante as campanhas militares romanas, é importado para Roma, como deus Sol, e acaba por ser incorporado no panteão romano, numa religião de mistérios chamada mitraísmo

Mitra - romano

Mais tarde virá a mitra papal católica, um diadema que simboliza aquele que defende terrivelmente a verdade. Pode-se dizer que é um deus que não saiu de moda, já que sua energia, brilho, disposição de ordenar é uma necessidade inerente a todos, sempre.   

Mitra Papal


Bibliografia
Rta Sukta - Rig Veda 10.190.1 e 2 [RRita sUkta – RRig veda]
CAMPBELL, Joseph, As Mascaras de Deus – Mitologia Primitiva. 8º ed, São Paulo: Palas Athena, 2010.
ELIADE, Mircea. O Sagrado e o Profano: a Essência das Religiões. 2ª ed, São Paulo: Martins Fontes, 2008.
KINSLEY, David R. Hindu Goddesses – Visions of the Divine Femine in the Hindu Religious Tradition. Berkley: University of California Press, 1998
BULLEN, Matthew, e et. National Geographic: Guia Visual da Mitologia no Mundo. São Paulo, Ed. Abril, 2010
WILKINS W.J, Hindu Mythology, Vedic and Puranic, 1900, at sacred-texts.com, in 05/10/2010
WILLIAMS Monier, Sankrit-English Dictionary, digital V1.5 beta

15 outubro 2010

A Procissão das Formigas

Indra e seu séquito

               Indra [ ] matou o dragão, gigantesco titã que descansava nas montanhas e que, sob a forma de uma nuvem serpenteante desprovida de membros, mantinha as águas do céu cativas no ventre. A divindade arremessou seu raio no centro da desconjuntada espiral e o monstro desmoronou como uma pilha de juncos secos. As águas irromperam, livres e suas torrentes fluíram através da terra, voltando a circular pelo corpo do mundo.
               Essa corrente é o rio da vida, que pertence a todos. É a seiva dos campos e florestas, o sangue que corre nas veias. O monstro apossara-se desse bem comum para satisfazer suas ambições. Criatura egoísta postara-se entre o céu e a terra, mas agora estava morto. Os fluidos estavam brotando novamente; os titãs se retiravam para os mundos ínferos; os deuses retornavam ao cume da montanha central da Terra, para reinar nas alturas.
               Durante o período da supremacia do dragão, as mansões majestosas da eminente cidade dos deuses haviam desmoronado, ruindo. O primeiro ato de Indra foi reconstruí-la. Todas as divindades celestiais proclamavam-no como salvador. Enaltecido pelo triunfo e consciente da própria força, convocou Vishvakarman [vishvakarman], deus das artes e ofícios, ordenando-lhe que erigisse um palácio digno do esplendor inigualável do rei dos deuses.

Vishvakarman
               Vishvakarman, o gênio miraculoso, conseguiu construir em apenas um ano uma suntuosa mansão, com palácios e jardins maravilhosos, lagos e torres. Mas à medida que o trabalho progredia, as exigências de Indra tornavam-se cada vez maiores, e mais ilimitadas e fantásticas suas visões. Exigiu novos terraços, pavilhões, mais piscinas, pomares e sítios aprazíveis. Toda vez que vinha apreciar a obra, o soberano dos deuses punha-se a arquitetar mais fantasias sobre as maravilhas que queria ver realizadas. O artífice divino, em desespero, decidiu buscar socorro nos céus, e apelar ao criador demiúrgico, Brahma [Brahma], corporificação prístina do Espírito Universal que habita muito além da agitada esfera olímpica onde reinam a ambição, a disputa e a glória.

Brahma
               Quando o suplicante Vishvakarman recorreu em segredo ao trono superior e apresentou seu caso, Brahma confortou-o: – Logo serás libertado desse encargo – disse-lhe. –Volta para casa em paz. Enquanto Vishvakarman, pressuroso, regressava à cidade de Indra, Brahma ascendeu a uma esfera mais alta, até chegar a Vishnu [viSNu], o Ser Supremo, de quem ele próprio, o Criador, não era mais que um agente. Em beatífico silêncio Vishnu escutou-o e com um simples aceno de cabeça, o fez saber que sua vontade seria realizada.

Vishnu
               Na manhã seguinte bem cedo um menino brâmane, portanto um bastão de peregrino, apareceu diante dos portões de Indra, ordenando ao porteiro que anunciasse sua visita ao rei. O porteiro correu até seu senhor e este se apressou em ir à entrada para dar as boas-vindas pessoalmente ao visitante auspicioso. Do esguio menino, que aparentava uns dez anos, irradiava-se o brilho da sabedoria. Indra foi encontrá-lo no meio de um bando de crianças maravilhadas, atônitas. O menino saudou o anfitrião com um olhar meigo nos olhos escuros e brilhantes. O rei curvou-se diante da criança divina, que o abençoou alegremente. Os dois encaminharam-se para o salão real, onde o deus procedeu à cerimônia das boas-vindas ao hóspede, com oblações de mel, leite e frutas, dizendo-lhe depois: – Ó Venerável Menino, diga-me qual é o propósito de tua vinda.

jovem brâmane
               A bela criança respondeu em voz profunda e suave como o lento trovejar de auspiciosas nuvens de chuva: – Ó Rei dos Deuses, ouvi falar do portentoso palácio que estais construindo e vim dirigir-nos as perguntas que me estão na mente. Quantos anos serão necessários para que se edifique essa rica residência majestosa? Que outros feitos de engenharia espera-se que Vishvakarman realize? Ó Rei dos Deuses! – o rosto luminoso do menino moveu-se com um sorriso bondoso, apenas perceptível – nenhum Indra que vos antecedeu conseguiu terminar um palácio como há de ser o vosso.
                Embriagado pelo vinho do triunfo, o soberano dos deuses divertia-se com a pretensão do menino de querer saber o que ele próprio ainda ignorava. Com um sorriso paternal, perguntou: –Responda-me, Menino! São muitos os Indras e Vishvakarman que já viste, ou de que, pelo menos, ouviste falar?
               O encantador visitante balançou, tranquilo, a cabeça: –Sim por certo, já vi muitos. –A voz era quente e doce como leite recém-ordenhado, mas as lentas palavras percorreram as veias de Indra como um calafrio. –Minha querida criança, prosseguiu o menino, conheci vosso pai, Kashyapa [kashyapa], o velho Homem-Tartaruga, senhor e progenitor de todas as coisas da terra, e o vosso avô Marichi [marIci], raio da luz celestial, filho de Brahma. Marichi, gerado do puro espírito do deus Brahma, tinha como única fortuna e glória a santidade e a devoção.
Brahma
          Também conheço Brahma, que Vishnu gerou do cálice do lótus germinando no seu próprio umbigo. E o próprio Vishnu – o Ser Supremo, que germinado no seu próprio umbigo. E o próprio Vishnu – o Ser Supremo, que sustém Brahma no seu empenho criativo -, a ele também conheço.

Brahma brotando do lótus do umbigo de Vishnu
               Ó Rei dos Deuses, conheci a terrível dissolução do universo. Assisti repetidas vezes ao perecimento de tudo, ao fim de cada ciclo. São tempos terríveis, em que cada átomo se dissolve nas águas primordiais e puras da eternidade, de onde originalmente tudo nasceu. Nesse momento tudo retorna à infinidade impenetrável e selvagem do oceano, no qual, coberto por total escuridão, não se vê qualquer vestígio de seres animados. Ah, quem contará os universos que desapareceram ou as criações que surgiram tantas vezes do abismo informe da vastidão das águas? Quem enumerará as eras do mundo, enquanto se sucedem ao infinito? Quem tentará, no espaço infinitamente amplo, contar um a um os universos, cada um deles contendo seu Brahma, seu Vishnu e seu Shiva [shiva]? Quem contará a totalidade dos Indras – os mesmos que, um a um, já reinaram certa vez em todos os inumeráveis mundos, ou os outros que desapareceram antes deles? Ou aqueles Indras que se sucederam em alguma dinastia, ascendendo ao trono divino, e um a um desaparecendo? Rei dos deuses, há entre vossos servos quem sustente ser possível contar os grãos de areia da terra e as gotas de chuva que caem do céu; contudo, jamais ninguém conseguirá enumerar todos os Indras. Isso é o que sabem os sábios.

               A vida e o reinado de um Indra duram 71 éons e, quando 28 Indras tiveram morrido, um dia e uma noite de Brahma terá transcorrido. Mas a existência de um Brahma, medida em tais dias e noites bramânicos, é de 108 anos. Brahma sucede a Brahma; um submerge e outro emerge: a sucessão infinita não pode ser medida. Não há fim para o número desses Brahmas – para não falar no dos Indras.

Infinitos Universos
                Mas aos universos, de per si, em qualquer momento dado, cada um abrigando um Brahma e um Indra, quem poderá estimar-lhes o número? Além da visão mais remota, constelando-se no espaço exterior, os universos surgem e desaparecem, em hoste inumerável. Como frágeis barcos, flutuam nas águas insondáveis e puras que formam o corpo de Vishnu. Em cada poro desse corpo um universo floresce e fenece. Acreditais poder contá-los? Podereis enumerar os deuses de todos esses mundos presentes e passados?
               Uma procissão de formigas aparecera no salão durante a fala do menino. Em formação militar, numa coluna de quase quatro metros de largura, a procissão desfilava salão afora. O menino percebeu-as, fez uma pausa, admirou-as. De repente soltou uma gargalhada estrondosa, para logo aquietar-se em silêncio profundo e introspectivo.
               – Por que ris? – gaguejou Indra. – Quem és tu, ser misterioso, sob teu disfarce de menino? – Agora estavam secos os lábios e a garganta do soberbo rei, cuja voz falhava continuamente. – Quem és tu, Oceano de Virtudes, oculto por névoa enganadora?
               O magnífico menino prosseguiu: – Ri por causa das formigas. A razão não pode ser contada; não me peçais para revelá-la. A semente do infortúnio e o fruto da sabedoria estão contidos nesse segredo. Ele golpeia como um machado a árvore da vaidade mundana, corta-lhe as raízes e dispersa-lhe a copa. Esse mistério é uma luz para aqueles que tateiam na ignorância. Submerso na sabedoria das idades, é raro que seja revelado, mesmo aos santos. É o ar que mantém vivos os ascetas que renunciam e transcendem a existência moral; mas destrói os mundanos iludidos pelo desejo e pelo orgulho.
               O menino sorriu e mergulhou no silêncio. Indra fitava-o, incapaz de mover-se. – Ó filho de um brâmane! – suplicou o rei, com nova e visível humildade – não sei quem és. Pareces ser a encarnação da sabedoria. Revela-me o segredo das idades, a luz que dissipa a escuridão.
               Solicitado a ensinar, o menino revelou ao deus a sabedoria secreta. – Vi as formigas, ó Indra, desfilando em longa procissão. Cada uma já foi um Indra, certa vez. Como vós, cada um dos Indras, por virtude de feitos piedosos, um dia ascendeu à condição de rei dos deuses. Mas agora através de muitos renascimentos, cada um se transformou novamente em formiga. Este é o exército dos que já foram Indras.

               Devoção e grandes feitos elevam os habitantes do mundo ao reino glorioso das mansões celestiais, aos domínios excelsos de Brahma e Shiva e a mais alta esfera de Vishnu; mas atos perversos fazem-nos mergulhar nos mundos ínferos, em poços de dor e sofrimento. A nova encarnação se dá entre pássaros e vermes, ou no ventre das porcas e animais selvagens, ou em meio a árvores e insetos. É pelos seus feitos que alguém merece a felicidade ou o sofrimento e torna-se senhor ou escravo. É pelos feitos que atinge a qualidade de rei ou de brâmane, de um deus, deu um Indra ou um Brahma. E ainda através dos feitos, contrai doenças, adquire beleza ou deformidade ou renasce sob a forma de um monstro.
               Esta é toda a essência do segredo, daquele saber que é a travessia para a bem-aventurança através do oceano do inferno.
               A vida no ciclo dos incontáveis renascimentos é como a visão de um sonho. Os deuses nas alturas, as árvores e as pedras silentes, são como aparições fantásticas. Mas a morte administra a lei do tempo: por ele predestinada, é ela a senhora de tudo. Efêmeros como bolhas são o bem e o mal dos entes do sonho. Em ciclos infindos, o mal e bem se alternam; nem a estes nem a coisa alguma, apega-se o sábio. O sábio não se prende a absolutamente nada.
               O menino concluiu o tremendo ensinamento e, em silêncio fitou o anfitrião. O rei dos deuses, em todo o seu esplendor celestial, reduzira-se aos próprios olhos, à insignificância. Nesse ínterim, outra assombrosa aparição ingressara na enorme sala.
Sadhu
               O recém-chegado pareceria ser uma espécie de eremita. Uma profusão desajeitada de tranças cobria-lhe a cabeça; cingia-lhe os quadris uma pele de antílope negra; na testa trazia pintada uma marca branca; a cabeça protegia-a um rústico guarda-sol de erva; no peito crescia-lhe um estranho chumaço circular de pêlos; estes se conservavam intactos na circunferência enquanto no centro faltavam muitos. O santo personagem encaminhou-se para Indra e o menino, acocorou-se no chão entre ambos e ali se postou, imóvel como uma rocha. O majestoso Indra, meio que recobrando seu papel de anfitrião, curvou-se em reverência, oferecendo coalhada com mel e alguns refrescos. Inquiriu, então, hesitante mas respeitoso, sobre o bem-estar do austero visitante, dando-lhe as boas-vindas. Quando ao menino, dirigiu-se ao santo homem com as perguntas que caberia a Indra fazer:
               – De onde vindes, ó santo homem? Qual é o vosso nome e o que vos traz aqui? Onde fica vosso lar e qual o significado desse guarda-sol de erva? O que pressagia o tufo circular de pelos que tendes no peito? Por que é denso na circunferência e ralo no centro? Tende a bondade, santo homem, de responder, em poucas palavras, estas perguntas. Anseio por compreender.
               O velho santo sorriu, paciente, e começou, lento a dar respostas. – Sou brâmane. Hirsuto é o meu nome. Vim até aqui para ver Indra. Como sei que tenho vida curta, decidi não ter lar algum, não construir casa, não me casar nem procurar sustento. Vivo de esmolas. Para abrigar-me do sol e da chuva levo à cabeça este guarda-sol de erva.
               Quanto ao círculo de pêlos em meu peito, apesar de ser fonte de aflição para os filhos do mundo, ensina a sabedoria. A cada Indra que cai, cai um fio. É por isso que já se foram todos os fios centrais. Quando a outra metade do período concedido ao presente Brahma [Brahma] chegar ao fim, eu próprio morrerei. Portanto, menino brâmane, restam-me poucos dias de vida! De que serviriam, então, esposa, filho ou casa?
               Cada mover das pálpebras do grande Vishnu [viSNu] marca a extinção de um Brahma. Tudo o que existe sob a esfera bramânica é tão insubstancial como uma nuvem que se forma e logo se dissolve. É por isso que me entrego, com exclusão de tudo o mais, à meditação cujo objeto são os incomparáveis pés de lótus do supremo Vishnu. A fé que lhe é dedicada significa mais do que a beatitude da redenção. pois toda a alegria, mesmo a celestial, é tão frágil quanto um sonho e apenas interfere na unicidade de nossa devoção a Ele, o Supremo.
               Shiva [shiva], aquele que concede a paz, o supremo guia espiritual, ensinou-me essa maravilhosa sabedoria. Não necessito experimentar as várias e bem-aventuradas formas de redenção; compartilhar as mansões divinas do supremo deus, desfrutar-lhe a eterna presença, ser igual a ele em corpo e vestes, tornar-me parte de sua augusta substância ou mesmo absorver-me por completo em sua inefável essência.

Shiva
                O santo homem cessou abruptamente de falar e desapareceu no mesmo instante. Era o próprio Shiva, que agora tornava à sua morada supra mundana. Ao mesmo tempo, desapareceu também o menino brâmane, que era Vishnu. O soberano, perplexo e atônito, estava só. Indra, o rei, refletiu: parecia-lhe um sonho o que acontecera. Mas ele não experimentava mais o desejo de ampliar o próprio esplendor divino ou de continuar a construir sue palácio. Convocou Vishvakarman. Cortês, saudou o artífice com palavras melífluas, cobriu-o de jóias e dádivas preciosas, e, depois de oferecer-lhe uma festa suntuosa, fez com que retornasse à sua morada.
               Indra, o rei, queria agora a redenção. Adquirira a sabedoria e seu único desejo era ser livre. Confiou ao filho o esplendor e o peso de seu cargo, preparando-se para isolar-se no ermo, vivendo como eremita. A bela e apaixonada rainha Shachi [shacI] encheu-se de aflição.

Shachi e seu marido Indra
                Chorando, em tristeza e total desespero, a divina consorte recorreu ao engenhoso sacerdote e conselheiro espiritual de Indra, Brhaspati [bRRihapati], o Senhor da Sabedoria Mágica. Ajoelhando-se a seus pés, implorou que fizesse com que seu marido abandonasse sua inflexível determinação. O sagaz conselheiro dos deuses, que com sortilégios e ardis auxiliara os poderes divinos a arrebatar o domínio do Universo das mãos dos titãs, seus antagonistas, ouviu com atenção as queixas da voluptuosa e desconsolada deusa. Com astúcia, sacudiu a cabeça em assentimento e, com um sorriso de feiticeiro, tomou-a pela mão e conduziu-a à presença do esposo. Assumindo, então seu papel de mestre espiritual, discursou sabiamente sobre as virtudes da vida do espírito e as da vida secular. Atribuiu a cada uma o que lhe era devido. Desenvolveu o tema com muita habilidade. O rei foi persuadido a abrandar sua determinação extremada, enquanto a rainha recobrava sua radiante alegria.

Brihaspati
               Brhaspasti, o Senhor da Sabedoria Mágica, elaborara certa vez um tratado sobre a arte de governar, para instruir Indra sobre o governo do mundo. Criava agora uma segunda obra, um tratado de como conduzir o amor conjugal e seus estratagemas. Instruindo sobre a encantadora e eterna arte da corte amorosa e do encadeamento do ser amado com laços duradouros, esse livro inestimável firmou sobre sólidos alicerces a vida matrimonial do casal reconciliado.
               Assim termina a maravilhosa história de como o rei dos deuses foi humilhado em seu orgulho sem limites, libertado de sua ambição excessiva e, através da sabedoria espiritual e secular, conduzido ao conhecimento do papel que lhe cabia nos ciclos da infinita mobilidade da vida[1]

 
ZIMMER, Heinrich Robert, Mitos e símbolos na arte e civilização da Índia; pgs 11 a 16, compilado por Joseph Campbell; tradução, Carmem Fischer – São Paulo: Palas Athena, 1989


[1] Nota do autor: brahmavaivarta purANa, kRRiSNa-janma khaNDa, 47.50-161.

13 outubro 2010

33 Devas na Astrologia Védica

por Pt. Sanjay Rath
tradução Flávia Venturoli Miranda

INTRODUÇÃO

     A maioria dos estudantes interpreta mal a palavra deva como significando deus. Na realidade, há 33 devas com aproximadamente 330 milhões de formas. A palavra é derivada da raiz div que tem dez significados[1] (para uma compreensão melhor, vamos ao glossário):
     1. krida - diversão
     2. vijigisha - conquista
     3. vyavahar - ocupação/atividade
     4. dyuti - inspiração intelectual ou esplendor
     5. stuti - elogio
     6. moda - prazer
     7. mada - alegria, intoxicação
     8. svapna - sonho 
     9. kanti - esplendor
    10. gati - direção, movimento
     
     Estas palavras definem o propósito de um deva. Jaimini define deva ou devata como indicado por devata karaka de um planeta Este é a terça parte na hierarquia (de necessidades espirituais) depois do atma karaka (ajudas na determinação do Ishta/Isha que dirige a emancipação do ciclo de renascimento) e amatya karaka (deidade que simboliza o alimento deste mundo). Assim deva ou devata é o Guru que guia ou ilumina certas habilidades inerentes que se desenvolverão nesta vida ou no caminho espiritual ou que conduzem ao cumprimento dos desejos etc. Nirukta[2] define deva como aquilo que
a)      confere benefícios (danada)
b)      ilumina (dipanad) ou
c)      é a fonte do conhecimento ou iluminação (dyutanad).
     Assim, traduzir deva como deus está conceitualmente incorreto. Esta visão é mais adiante confirmada sem um tico de dúvida no Aitereya Brahmana[3] como também o Sathapatha Brahmana[4]. A pergunta natural é: “se deva não são deuses, então quem ou o que é o deva e de que maneira eles estão associados ao jyotish, a astrologia védica”?

katame te trayastrimshat iti ashtou vasavah
ekadasha rudra, dvadasha adityah ta ekatrimshat
indraschaiva prajapatischa trayatrimshaviti
 Sathapatha Brahmana 14.16:
“Falamos dos trinta três (devas) de qual oito vasus,
onze rudras e doze adityas somam trinta um.
Indra e Prajapati incluidos traz seu número a trinta três.”

1. Ashta Vasava (Oito Vasus)

katame vasava iti.
agnischa prithivi cha vayusch antarikshamchadityascha dyauscha chandramascha nakshatrani chaite vasava aeteshu hidam sarve vasu hitam aete hidam sarve vasayante taddyudidam sarve vasayante tasmad vasava iti.
Sathapatha Brahmana 14.16:
Surya & Chandra

     O Sathapatha Brahmana dá a lista dos

     “Vasus são:
     1. Agni
     2. Prithvi
     3. Vayu
     4. Antariksha
     5. Aditya
     6. Dyau
     7. Chandrama e
     8. Nakshatra.”
 
     À primeira vista, isto pode parecer um pouco contraditório já que aditya também foi mencionada separadamente, mas aqui se refere ao Sol, chandra refere-se à Lua, nakshetras são as mansões lunares ou as constelações e os cinco restantes representam os estados da existência material. Estes oito formam a fonte primária de iluminação do eu. Eles representam as variáveis básicas que definem toda criação e sua fonte original de iluminação nos dez métodos definidos anteriormente como o propósito do deva. O Vishnu Purana torna isto mais lúcido na definição do vasu como:
água fogo ar terra
      1. apa - jala tattva ou líquido
     2. dhara - prithvi tattva ou sólido
     3. anila - vayu tattva ou gás
     4. anala - agni tattva ou energia
     5. dhruva - a Estrela Polar representando
a)      akasha tattva - o céu ou vazio e
b)      estabilidade do zodíaco i.e. a relevância de ayanamsa
 
Dhruva - Estrela Polar
     6. soma – a Lua
     7. pratyusha - a representação da Aurora recorrente
a)      O Sol - como causador da noite e do dia, isto é, a fonte de luz por detrás do amanhecer,
b)      lagna - o ascendente ou o ponto no horizonte oriental como representação do eu e é comparado ao amanhecer. 

                                       Lagna
     8. prabhasa – a luz esplendorosa das estrelas que se agrupam em 27/28 Nakshatras (Constelações).

Constelação de Escorpião
      Esta lista é o primeiro princípio do jyotish, cujos corpos criam todos os seres como também os guiam por diversas atividades definidas. Estas incluem
a)      o Sol,
b)      a Lua,
c)      as constelações chamadas de nakshatras e
d)      os pancha tattvas ou (orientação/direção) os cinco estados da existência de toda a matéria e energia. 
 
Sistema Solar
Assim, o luminares (Sol & Lua), os cinco planetas o Marte, Mercúrio, Júpiter, Vênus e Saturno [regendo os cinco estados de energia (agni), sólido (prithvi), espaço (akasha), líquido (jala) e ar (vayu) respectivamente] e os 27 (ou 28) mansões lunares chamadas de nakshatras, formam o primeiro princípio. O nascimento insinua a criação e este é o princípio de sattva do suporte do ser nascido ou criado. 

27 Nakshatras - Constelações

2. Ekadasha Rudra

katame rudra iti.
dasheme purushe prana atmaikadashah te yadasmat martyacchriradtkramanti
atha rodanti tad yad rodayanti tasmad rudra iti
                                             Sathapatha Brahmana 14.16:
11 Rudras
      Os onze rudras[5] são definidos como devas. Dez destes são rudras responsáveis por sustentar o prana (força da vida, vital, ou ar) dentro do corpo que sustenta a respiração e a vida. Assim, a natureza deles é semelhante a de Marut, o deus da tempestade, e, de certo modo, com vayu (o elemento ar). O décimo primeiro rudra é Maheshvara e é o responsável pelo atma (alma). Estes são chamados de rudras, da raiz rud que significa chorar, já que a partida deles resulta a morte da pessoa, e os parentes e amigos choram.
5 pranas mais importantes
     Este onze rudras (inclusive Maheshvara) são responsáveis pela destruição de tudo o que foi criado e formam o segundo princípio do jyotish. Na primeira fase, há a destruição do corpo físico pelo partida de quaisquer dos dez rudras. Depois disso o atma (alma) é separado de manas (mente) por Maheshvara (Shiva), o décimo primeiro rudra

Maheshvara
 
     Os dois nodos lunares chamados rahu e; ketu são os destruidores. Rahu tem a responsabilidade de destruir os luminares e os signos (dvadasha aditya). Ketu destrói a criação material representada pelo pancha tattva (no jyotish, os cinco planetas o Marte, Mercúrio, Júpiter, Vênus e Saturno) e os nakshatras

Rahu Keu Yantra
     Os rudras podem ser vistos como as forças que se unem em qualquer ser criado, tanto viventes como não viventes. Eles simbolizam a força de Deus e são também a força do ser criado já que a partida deles resulta na fraqueza do corpo que é destruído. 

3. Dvadasha Aditya

katame aditya iti.
dvadashamasah samvatsarasya aita adityah aite hidam sarvamadadanayanti
taddvididam sarvamadadana yanti tasmaditya iti.
                                            Sathapatha Brahmana 14.16:
12 Rashis - Signos
      Dvadasha significa doze e masa significa mês - assim os dvadasha (doze) adityas são os doze meses representados pelos doze signos no zodíaco. O mês é variavelmente definido no jyotish e esta referência específica indica o movimento durante o período entre duas conjunções sucessivas da lua. Este é o mês sinódico que é aproximadamente 29 dias e meio que para conveniência são considerados como 30 dias. Já que a média do movimento geocêntrico do Sol durante 30 dias é 30 graus, isto define o saura masa (mês solar) que é o terceiro princípio de jyotish. Doze destes “30 graus de movimento” faz com que o Sol volte a sua posição original e isto define o samvatsara ou ano solar. Assim, o terceiro princípio de jyotish é este do tempo & espaço que é definido pelos dvadasha adityas (doze signos do zodíaco tendo o Sol como seu chefe supremo). O mês solar e ano solar são a base da astrologia védica e aquelas sub-divisões adicionais de tempo serão determinadas baseadas nos movimentos solares. A palavra samvatsara significa ano, mais especificamente ano solar, já que está baseado nos dvadasha adityas. Este conhecimento é de importância vital na determinação do período de influência dos planetas chamados dashas. Frequentemente, os astrólogos se atrapalham em concepções errôneas sobre usar o ano solar ou lunar ou até mesmo outras variedades definição de  períodos de tempo. Isto indica a falta de avaliação deste princípio de tempo & relação espacial como definida pelo dvadasha adityas.

     São chamados de adityas por serem os distribuidores do alimento e de todos os materiais necessários para criação e alimento (dana) como também inspiração, alegria, intoxicação, vitalidade sexual e vigor (mada). Os adityas são os doadores e tudo vem deles. Assim, os doze signos representam todas as formas materiais de criação.

4. Indra e Prajapati

katama indrah katamah prjapatiriti.
stanayitnurevendro yajyah prajapatiriti.
katama eko deva iti sa brahma tyadityachakshate.
                                            Sathapatha Brahmana 14.16:
Indra, o rei do Céu
     Stanayitnu significa trovão ou raio e refere-se aos impulsos elétricos que são usados pelo cérebro para controlar os sentidos. Assim, Indra é o semideus que controla os sentidos e o funcionamento do cérebro como também a inteligência de toda a criação. Yajna é o culto ou a louvação a Prajapati, o progenitor. Este é o quarto princípio do jyotish e é chamado de lagna, ascendente, representando o assento de Prajapati, o progenitor, e o “louvor ao Valioso”. Indra está sentado no trono do zodíaco indicado pelo ponto no meio do céu. Esta é a área da décima casa contada do lagna, signo ascendente.
     O zodíaco, a qualquer ponto do tempo, é dividido em duas metades pela linha do horizonte. Considerando que a Terra gira do oeste para o leste, os planetas e outras estrelas parecem se mudar para a direção oposta de qualquer ponto estacionário de observação na Terra. O Sol sobe no leste pela manhã, ascende ao meio-céu (meio do céu) antes do meio-dia e então começa a descer até se por no horizonte ocidental. Lagna é o ponto no horizonte oriental que está quase para ascender ou subir nos céus representado pela metade visível do zodíaco e é semelhante a hora do sol nascer. Isto é chamado de ascendente. Da mesma maneira, o ponto no horizonte ocidental que quase está para descer ou ir para abaixo do horizonte é chamado de descendente. O zodíaco é dividido em duas metades chamadas de drusyaadrusya (invisível) pela linha do horizonte com o céu na metade visível e a porção inferior do horizonte na metade  invisível. Os drusya rashis, signos do zodíaco (completos ou partes) na metade visível, estão nos céus chamados de lokas, enquanto que os adrusya rashis, signos do zodíaco (completos ou partes) na metade invisível ou abaixo do horizonte são chamados de infernos, talas. Há dois postulados baseados na (visível) e
     1. existência material ou física e  
     2. existência espiritual para descrever estes céus e infernos.
4.1. Os Três Mundos Materiais
     O universo físico pode ser classificado em três partes chamadas de bhu loka (Terra), bhuva lokanava graha[6]) e svarga loka (céu que contém as estrelas fixas que são a residência dos semideuses). O zodíaco geocêntrico (bhu loka como seu centro) limitado ao bhuva loka é chamado de o chakra de Vishnu (zodíaco tropical onde os tempos e outros fenômenos da atmosfera e além são vivenciados). O zodíaco geocêntrico baseado nas estrelas fixas no céu é chamado de o chakra de Narayana (zodíaco sideral). Estas condições são mencionadas especificamente no Vishnu Purana. O hindu piedoso recita a oração Om bhur bhuva svah, todas as manhãs para as bênçãos desta criação material, como um prefixo para o mantra de gayatri. (firmamento ou o sistema solar que contêm os
4.2. Os Quatorze Mundos Espirituais
     Assim, há sete céus e sete infernos. Os céus chamados lokas[7] são em sete partes: 

lokas e narakas no corpo
  • A porção visível do lagna (signo/casa ascendente) que ascendeu, ou seja, desde o começo do signo à longitude do ascendente chamado satya loka simbolizados pelas mil pétalas de lótus na qual descansa Prajapati (na forma de Brahma), o progenitor. Este é o assento do criador e Ele é louvado por toda Sua criação. Mostra a fama como consequência do louvor, saúde e vigor.
  • A porção visível da sétima casa/signo que está a ponto de descer ou entrar na metade invisível, ou seja, da longitude do descendente para o fim do signo chamado de bhu loka (plano terrestre). Mostra a morte e renascimento já que este é também o mrityu loka, onde a morte ocorre.
  • A décima casa/signo (o meio do céu é o trono de Indra) chamado de svah ou svarga loka.
  • Os signos/casas restantes na porção visível (8º, 9º, 11º & 12º) são o bhuva, maha, janah e tapah loka.
      Assim, os sete céus são bhu, bhuva, svah, maha, janah, tapah & satya loka e as deidades dos planetas o Marte, Sol, Vênus, Mercúrio, Lua, Saturno e Júpiter respectivamente, regem cada um destes lokas. Os sete infernos são os sete signos na porção invisível do zodíaco chamados de atala, bitala, sutala, talatala, rasatala, mahatala e patala respectivamente. Há sete narakas (os mais inferiores infernos para castigo) abaixo destes sete talas e são todos situados no nadir, ou seja, no ponto do meio do céu precisamente oposto a quarta casa. O hindu espiritual recita o mantra "Om bhur, Om bhuva, Om svah, Om maha, Om janah, Om tapah, Om satyam" todos os dias como um prefixo para o mantra de gayatri aspirando pelos céus mais elevados.

     Assim, em qualquer mapa, a sétima casa é examinada para morte e renascimento. Se a morte acontecer durante o período do planeta na sétima casa ou seu regente, então o renascimento seguramente acontecerá. O lugar de renascimento pode ser adivinhado pelo planeta/signo na sétima casa. Por exemplo, se Marte estiver na sétima casa, o renascimento será em uma ilha como o Sri Lanka. Outras indicações podem ser lidas em textos padrões. Também é por esta mesma razão que Parasara recomenda o Mritunjaya Mantramoksha (emancipação do ciclo de renascimento) durante tais períodos de planetas conectados com a sétima casa. A 12ª casa ou a porção um pouco antes do lagna é o satya loka, o ponto espiritual mais elevado e além desta é a região espiritual onde não há retorno. Através da constante repetição do Om tat sat e vivendo uma vida honesta, o adorador atinge satya loka e os céus mais elevados além de onde não há retorno a este mrityu loka. com sua oração para

     Assim, concluímos que os 33 devas são um paradigma básico do jyotish e que também podem se agrupar baseados na mobilidade. Estes grupos incluem:
a)      as estrelas fixas ou estacionárias formam o grupo de 27 (ou 28) nakshetras,
b)      as divisões de espaço e tempo formam o grupo de rashis ou dvadasha adityas  e
c)      os luminares
1.       Sol
2.       Lua,
os controladores dos pancha tattvas
3.       Marte,
4.       Mercúrio,
5.       Júpiter,
6.       Vênus
7.       Saturno e
os representantes de Rudra
8.       Rahu
9.       Ketu
que formam o terceiro grupo de corpos móveis chamados de graha.

Navagraha - 9 Planetas

     Considerando que estes são nove em número, são chamados nava graha. Usaremos a definição forçada de “planetas” para indicar estes nove corpos móveis. O Sol não é móvel dentro do sistema solar, mas é de um ponto de vista geocêntrico, isto é, assumindo que a Terra é estacionária, seu movimento é traduzido como sendo o movimento do Sol.

[1] dhatupatha
[2] ibid 7.16
[3] Shloka 1.6 Satyasamhita vai deva
[4] Shloka 3.7.3.10 Vidmanso hi deva
[5] Jaimini deu detalhes consideráveis sobre o calculo destes onze rudras (de fato dez rudras e o décimo primeiro ele chama de Maheshvara ou Shiva, que é o responsável para libertar a alma). Estes foram discutidos nos Volume VIII (Ayur Khand - Longevidade).
[6] 9 planetas
[7] Os nomes dos sete lokas como dados aqui é do Markandeya Purana. Seres humanos residem no bhu loka (plano terrestre), enquanto pássaros, nuvens e os semideuses residem no bhuva loka. Os nomes dados para os sete céus indicados pelos sete sinais são diferentes em outras literaturas védicas. Porém, são aceitados os nomes dados aqui como tão autênticos quanto o Rishi Markandeya que  foi o recipiente do conhecimento védico dos Maharishis através dos Rishi Chyavan e Daksha Prajapati. Ele também era o avô de Parasara.