20 janeiro 2024

viparita karani asana ou mudra?

por Flavia Venturoli Miranda
20/01/2024

Para abordar a inversão da posição do corpo nos asanas, tenho que começar com uma mudraViparita Karani Mudra, selo da ação invertida, é uma das mudras que acabou virando asana provocando uma confusão com essa sua situação no legado do Hatha Yoga atual.
 
Então, primeiro explico resumidamente as principais ferramentas* do Hatha Yoga:
Asanakumbhaka (pranayama), mudra, samyama (dharana, dhyana e samadhi).
Com os asanas se alcança o fortalecimento do corpo. Com os pranayamas se tem a leveza que advém da purificação das nadis e do início da jornada da kundalini. Com as mudras vem o equilíbrio entre os vários koshas pela selagem de algumas nadis para conduzir o prana através de ações rituais que convidam a kundalini a ascender. Finalmente, a parte principal de todo o yoga que é a meditação, com suas 3 etapas de concentração, meditação e fusão.  Assim, o Hatha conduz ao Yoga Supremo.
 
O Hatha refina e apura o corpo com seus vários envoltórios (koshas) através da alquimia de suas práticas para que o adepto esteja preparado ao chegar ao cume dessa jornada que é a meditação. Yoga é a desalienação e desidentificação com a matéria para a fusão de si em si mesmo. Nem é possível resumir o hatha e tão pouco o yoga, por isso fico por aqui mesmo, nesse momento.

Voltando as posturas invertidas. Aqui temos uma distinção clara de objetivos do asana como fortalecimento do corpo e da mudra como equilíbrio para invocação da energia suprema. Assim, se a famosa viparita karani é executada como asana, seu objetivo maior como mudra é neglicenciado. Contudo ainda sim é importante praticar o viparita karani asana, porque é um preparo para a prática da mudra. Como asana, se atem aos detalhes físicos do preparo e execução, do posicionamento dos membros, da sustentação com atenção e sem tensão na permanência, e da respiração tranquila.


Viparita karani mudra é a ação de inverter a posição do sol residente na região do umbigo com da lua na raiz do palato. A lua exsuda a ambrosia da imortalidade, amrta. O sol consome tudo que recebe. Assim, constantemente, o fogo gástrico devora a ambrosia que cai do palato, consumindo a existência. Na inversão, o umbigo fica em cima e o palato em baixo, ou seja, o sol fica para cima e a lua para abaixo, o fogo gástrico continua ascendente, mas não mais consome a ambrosia que está abaixo e ela secreta para o topo da cabeça apenas, prolongando a existência e a transformação alquímica por esse néctar.
 
Então, lembre-se que se sua pratica de viparita karani já atingiu os estados de estabilidade – sthira e de conforto - sukha, produzidos pelo fortalecimento, já é chegada a hora de praticar a mudra e começar a convidar a kundalini.
 
Ao se por em viparita karani, por algum tempo focalize no sol e deixe o fogo gástrico queimar as impurezas da região abdominal. Depois, por algum tempo a mais, foque na lua e sinta o sereno lunar inundar sua cabeça de néctar. Deixe que essa seja sua “meditação” nesse dia.
 
Tenha uma vida longa e próspera.
 
* Essas ferramentas variam entre os diversos textos antigos, mas resumidamente é isso.


02 dezembro 2023

Setubandhasana

Postura da Ponte
setu - ponte, limite, ligação, marco
bandha - confinamento, grilhão, atadura, ligação, consequência
setubandha - ponte de Rama

Ponte é uma construção que interliga dois pontos não acessíveis separados por algum obstáculo. A ponte simbolicamente cria uma passagem de transposição de lugar, tempo, pessoas, ideias, sentimentos entre outros.


É comum que pontes sejam sustentadas por arcos. Neste asana, a coluna é o arco que sustenta a ponte de Shakti para Shiva, onde a grande estrada (mahapatha) é perpassada pela kundalini. O asana fortalece as estruturas para que a ponte esteja pronta para o grande tráfico da Maha Shakti.


É uma postura “extrovertida”, pois abre a parte frontal do corpo, que é o lado voltado para o nascer do sol (purvottana) O asana induz a execução do mulabandha (contração da raiz) e o jalandhara bandha (chave de pescoço), ou seja, estimula os muladhara e vishudha chakra.


Setubandhasana prepara para as posturas invertidas sobre os ombros (viparitakarani e sarvangasana). Como inverte as posições dos chakras juntamente com a execução natural do mulabandha, as impurezas de apanavayu são conduzidas para incineração no manipura chakra. O jalandhara bandha  também acontece espontaneamente, impedindo o desperdício do amrita.  Produzindo uma purificação e o aumento da vitalidade.

Rama Deva, heroi do Ramayama
Setubandha remete a ponte mítica construída pelo exército do príncipe Rama para resgatar sua princesa Sita, como relata a epopeia Ramayana. Sita havia sido sequestrada no subcontinente indiano e levada refém para a ilha do atual Sri Lanka.
setubandha em construção
 

O príncipe Rama ajudado por um exercito de macacos para libertar a princesa precisam transpor o oceano para alcançar o cativeiro na ilha. Primeiramente Rama tenta com diversas armas secar o oceano, sem sucesso. Durante uma meditação Varuna deva, orienta Rama a procurar o engenheiro Nala e seu irmão Nila para construir uma ponte para invadir a ilha e resgatar a princesa. O exercito de macacos  constroem a ponte jogando pedras no oceano e o resgate é um sucesso.

exercito de macacos na construção da ponte

Há uma curiosidade sobre essa ponte mítica, hoje chamada de ponte de Rama (ou de Adão), pois realmente há uma conexão natural subaquática entre a Índia e o Sri Lanka, o estreito de Palk. O estreito possui entre 53 a 80 km de extensão e é formado por uma cadeia de bancos de areia acima do nível do mar.

estreito de Palk

23 agosto 2023

Ardha Navasana

meia postura do barco, mas vou chamar de postura da canoa
ardha – meio
nava – barco
de Flávia Venturoli Miranda



O ardha navasana é uma preparação para o navasana, uma versão aparentemente mais leve que a segunda. Em um jogo de palavras, ao invés de chamar de meia postura do barco, chamo de postura da canoa, inclusive pela a semelhança ao meio de transporte. A canoa é menor e ancestral, e evolui para barco e navio.
 
Ardha navasana é um asana com pouca elevação do chão, o que deixa a “embarcação” mais rasa e longa, como uma canoa que rasga um rio. No navasana, fecha-se o anglo do tronco com as pernas, deixando a “embarcação” mais imponente e alta para enfrentar ondas e mares revoltos. Saiba mais aqui.

Na postura da canoa, a lombar e as nádegas ficam apoiadas no solo, os braços fletidos com as mãos na nuca e as pernas pouco elevadas. Faz-se com trabalho abdominal, sem sobrecarregar a coluna lombar. Por isso é indicada como preparação para dominar o navasana, cujo foco do fortalecimento abdominal cobra muito da lombar. Para partir do shavasana para executar o navasana requer potência inicial, mas a permanência no equilíbrio é tranquila.
 
Na variação da postura da Canoa Ubá, também ao rés do chão, erguidos são o tórax, os braços (colados nas orelhas acima da cabeça) e as pernas esticadas (apenas a uns 20cm do chão). O que desenha claramente uma canoa caiçara que é uma embarcação estreita, rasa e leve, cujas ambas as extremidades são ainda mais delgadas. Ubá (em tupi antigo) é feita em uma única peça, em que um grande tronco é esculpido. Dessa forma, ubá é uma embarcação resistente e de longa duração.
Essas características listam objetivos que se conquistam com o domínio da postura da Canoa Ubá. Aqui se trabalha fortemente com os músculos abdominais supra e infra, já que os braços erguidos e as pernas esticadas próximas ao chão servem de contrapeso, e exigem mais força do centro do corpo. Quando executado com frequência a postura da Canoa Ubá, deixa o “tronco esculpido”, o corpo torna-se mais esguio, leve e ágil. No ardha navasana, não requer potência para iniciar, mas exige resistência para permanecer, sendo mais forte do que na postura do barco.

Fonte
aulas de Bhola Nath Yogi

Fonte Histórica
naukasana segundo a Encyclopaedia of Tradicional Asanas – Dr. M. L. Gharote – Lonavla é citado no Kapala Kurantaka Hahtabhyasa Paddhati 11.